A Gestão de Projectos e o Mundo VUCA

Rodolfo Stonner, Palestrante e Consultor – construindo projectos de sucesso, Liderança e Gestão, escreveu ao nosso Portal que o século XX, intervalo entre a eclosão da Revolução Industrial e o actual mundo VUCA (Volatility – volatilidade, Uncertainty – Incerteza, Complexity – Complexidade, Ambiguity – Ambiguidade), foi, do ponto de vista empresarial, um relativo “mar de almirante”, expressão brasileira que traduz um clima de tranquilidade e instabilidade. Rodolfo Stonner

Com efeito, excluindo-se os fenómenos sociais, as duas guerras mundiais, a guerra fria, Coreia e Vietname, no mundo empresarial tudo corria bem. As empresas consolidavam-se, as marcas eram fortes e quase pétreas, o planeamento estratégico das organizações podia estabelecer horizontes plurianuais, frequentemente quinquenais.

Neste cenário, a Operação e Manutenção reinavam quase absolutas, com seu ciclo de vida previsível e quase-estático. A maioria dos projectos, então existentes, com seu ciclo de vida tão distinto da Operação & Manutenção, eram, praticamente, todos de engenharia: novas plantas industriais, ampliação de usinas existentes, grandes obras civis, estradas, ferrovias…

Neste cenário, ao fim da década de 60, mais precisamente em 1969, surge o PMI – Project Management Institute – com a finalidade de gerar conhecimento e promover a gestão de projectos, ramo da gestão com características bem diversas da gestão tradicional.

A importância crescente dos projectos levou ao rápido crescimento do PMI, maior organização mundial do género, chegando, ao limiar do ano 2000, a 40.000 membros activos, 10.000 profissionais certificados como PMP, e actualmente mais de 600.000 membros activos em mais de 185 países.

Porém, a virada do milénio trouxe novas configurações, novos tempos, novas visões – tudo o que caracteriza o mundo VUCA. Empresas sólidas derreteram-se: Kodak, Blockbuster, Nokia…

“Loucura é querer resultados diferentes fazendo tudo igual”. Lembrava-me desta frase de Einstein… ao buscar a exacta redacção desta frase na Internet, apercebi-me de que esta frase jamais foi proferida por Einstein!!! Mais uma característica do mundo VUCA, as “fake News”! Mas, independente da autoria, a frase ilustra a necessidade de as empresas buscarem novos caminhos, novas alternativas – em resumo, se faz necessário construir NOVOS PROJECTOS! E, cada vez mais rápidos e transformadores. O ciclo de vida dos projectos e produtos oriundos destes projectos são cada vez mais curtos: há poucas décadas, orientávamo-nos por mapas, aí surgiram os aparelhos de GPS (Global Positioning System), por alguns anos quase omnipresentes em nossos veículos. E agora incorporados aos celulares, os quais vêm se tornando cada vez mais um apêndice indispensável a nós, humanos.

A própria pandemia forçou a Humanidade a um novo processo evolutivo. Por exemplo, o EAD – Ensino à Distância – sofria fortes restrições antes de 2019, e actualmente identificamos aí um caminho sem volta, abrindo precedentes à medicina online, psicoterapias à distância…

E os projectos, com tudo isto que vem ocorrendo?

Até a sexta edição do PMBOK Guide, o processo de gestão de projectos era muito focado em processos: entradas, técnicas e ferramentas, saídas. Mas, na sétima edição do PMBOK Guide, ocorreram algumas mudanças significativas.

Até então, se dava extrema importância ao sucesso da GESTÃO do projecto: Prazo, Custo, Escopo, Qualidade… Não que isto actualmente não seja importante, mas o foco se ampliou para ver o sucesso do ACTIVO. Exemplo típico é do Sydney Opera House – conquanto um fracasso em termos de gestão do projecto, orçamento decuplicou, atrasou mais de dez anos, é actualmente Património Mundial da Humanidade, declarado pela UNESCO em 2007, e motivo de orgulho para todos os australianos.

Neste viés, o conjunto de acções da Gestão de Projectos e da Gestão de Activos têm cada vez mais uma maior intersecção.

Outra questão é quanto à utilização dos Processos. À medida que os projectos evoluem para contemplar cada vez mais as mudanças do mundo actual, e neste aspecto os projectos de Tecnologia da Informação têm um papel cada vez mais relevante, abrindo espaço para metodologias ágeis, não há sentido em falar de processos quase fixos, quase imutáveis, rígidos. A partir daí, o PMBOK Guide foca mais em princípios. E qual seria a diferença?

O exemplo que me vem à mente é da religião. Quando observamos as religiões cristãs, sejam o catolicismo, o protestantismo, com suas diferentes vertentes, o espiritismo, e mesmo as religiões brasileiras oriundas do sincretismo cristão com a cultura e religiosidade africana, fica evidente que os PROCESSOS (formas de manifestação) são totalmente diferentes. Uma missa em uma igreja católica é totalmente diferente de um culto em um templo protestante (e ainda dentro do protestantismo, há cultos muito diferentes), bem como uma sessão de espiritismo ou uma manifestação do candomblé. Porém, os PRINCÍPIOS são os mesmos: fazer o bem, amar ao próximo, não roubar, não matar, etc.

O próprio prefácio do PMBOK Guide 7ª edição, em sua justificativa das mudanças, anuncia: “Modelos organizacionais evoluídos produziram novas abordagens de projecto, novas estruturas de equipa, uma diversidade de modelos de entrega de projectos e produtos, e um foco mais forte em resultados (grifo do autor do artigo), em vez de entregas”. E ainda: “Embora eficazes no apoio às boas práticas, os padrões baseados em processos são prescritivos por natureza. Com a gestão de projectos evoluindo mais rapidamente que nunca, a orientação baseada em processos das edições anteriores não pôde ser mantida de maneira a refletir o cenário de valor total das entregas. Portanto, esta edição evolui para um padrão baseado em princípios a fim de apoiar a gestão de projectos de forma mais eficiente e focar mais nos resultados pretendidos, em vez de entregas”.

Dentro deste novo cenário, quais posturas são relevantes para o Gestor de Projectos no mundo VUCA?

  • Estar sempre atento às mudanças. O Planeamento Estratégico nunca teve um horizonte tão próximo.
  • Observe com atenção não apenas o ciclo de Gestão do Projecto, mas o Ciclo de Vida do Activo.
  • Tenha sempre em mente o conceito de Valor. Uma barra de chocolate pode ter um custo mais interessante para você, gestor de projectos, enquanto pai, do que um ovo de Páscoa com o mesmo peso, mas para seus filhos ou netos, o valor de um ovo de Páscoa é muito mais interessante. Descubra quais Ovos de Páscoa você pode oferecer aos clientes…

Claro que há muitos outros aspectos, mas reputo estes como dos mais importantes. Sucesso em seus projectos e nos activos!

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